terça-feira, 21 de março de 2006

Um pedacinho do meu trabalho de conclusão de curso. Lucas Bataglin, hoje jornalista na Globo, chorou durante a entrevista. Choramos.

Lágrimas de palmeirense

Em 1976, a TV Cultura criou um telejornal voltado para a cidade de São Paulo que pretendia investir nas grandes reportagens. Era diário, mas explorava um ou dois fatos do dia com maior verticalidade. O telejornal foi batizado com o nome de “Hora da Notícia Reportagem”. Qualquer assunto era abordado dentro do telejornal com uma perspectiva investigativa, até mesmo o futebol.

Luis Carlos Bataglin, ou Lucas Bataglin como é conhecido, nunca foi jornalista esportivo. É jornalista e trabalhava como repórter no telejornal.

Bem no Campeonato Brasileiro, o desempenho do Corinthians causou uma comoção nos torcedores, que estavam sem ver a conquista de um título há 22 anos. Junto com a sua equipe, Bataglin sentiu que a semifinal do Brasileiro se tornaria um fenômeno e decidiu acompanhar de perto o momento.

A pauta não foi de Bataglin, nem mesmo corinthiano ele é. Mas o palmeirense foi escalado para registrar a viagem no ônibus número um dos Gaviões da Fiel, junto com o cinegrafista Nilo Motta e o operador de áudio.

Antes da caravana, o jornalista escolheu alguns nomes de companheiros de viagens e traçou quatro perfis dos torcedores aqui em São Paulo. “Uma das torcedoras era florista, o que é interessante porque o Corinthians tem aquela imagem popularesca, aquele preconceito contra corinthiano que é tudo gente de baixo nível e nós queríamos diversificar, ampliar o leque para mostrar a pluralidade que tem dentro de uma torcida organizada”, conta Batalgin. “Também escolhemos acompanhar um casal de Guarulhos que estava noivo e um ex-presidente dos Gaviões da Fiel, o Cláudio Simões.”

A perspectiva da reportagem não era acompanhar o torcedor e mostrar como se portava a torcida no estádio, mas qual é o simbolismo do futebol, de uma grande paixão como o Corinthians, para o ser humano, para o cidadão. Na pauta, tanto fazia se o Corinthians ganhasse, perdesse, empatasse. Nilo Motta, inclusive, manteve sua câmera de costas para o jogo o tempo todo.

E o repórter palmeirense entrou no clima alvinegro e torceu para o Corinthians: “Você acaba se envolvendo”, justifica Bataglin. “Vimos de tudo, até um cego assistindo o jogo.”

No meio da torcida corinthiana, o que o repórter mais encontrou foi a humildade. “Gente que veio do Nordeste, de regiões pobres e que se encontram na torcida do Corinthians. Parecia que na torcida essas pessoas se sentiam integradas e o futebol é algo que integra com energia positiva. Senti como era importante para aquele povo torcer para o Corinthians. Era um fator de agregação, de se sentir pertencendo à alguma coisa maior que você, onde você encontra um igual.”

Bataglin gosta de futebol e acompanha seu time. Nunca pensou em fazer parte de uma torcida organizada. “Não tinha preconceito algum em relação à torcida organizada. Respeito muito à torcida do Corinthians e ela sempre foi uma torcida arrepiante. Tenho muita admiração.”

A viagem marcou o jornalista. “Fiquei espantado com alguns personagens. Como a florista, mulher, classe média, trinta e poucos anos. Foge dos estereótipos criados dentro de uma torcida organizada. Isso foi surpreendente. A viagem foi bonita e emocionante porque a Via Dutra foi tomada por carros e ônibus com bandeiras do Corinthians. Parecia que estávamos indo ao Morumbi, mas eram 450 km.”

O repórter cinematográfico, Nilo Motta, conheceu uma corinthiana na viagem. Namorou, noivou e casou com ela.

Apesar de emocionante e surpreendente, não foi essa a vez que os Gaviões da Fiel mais arrepiaram Bataglin. Pai de um são-paulino, foi a um Corinthians e São Paulo acompanhar o filho, anos depois da reportagem de 1976. Com meia hora de jogo, o Corinthians perdia de 3 a 0.

Caía no Morumbi uma garoa fina e dois terços do estádio estava tomado de corinthianos. “Quando acabou o primeiro tempo, eu conversava com meu filho quando ouvimos uma movimentação da torcida corinthiana”. A Gaviões da Fiel se levantou e começou a cantar o hino do Corinthians. Logo, todos os outros milhares de corinthianos cantaram também.

A torcida do São Paulo assistiu atônita. O palmeirense Bataglin também. Emociona-se ao contar a história. “Gosto muito de meu time e jamais vou deixar de ser palmeirense, mas nunca vi algo igual. Nenhum outro clube do Brasil tem uma torcida como essa. Foi no dia em que o Corinthians perdeu de 3 a 0, tomando um baile, que eu mais me emocionei com a torcida do Corinthians. Eles cantaram como se dissessem: ‘Olha, estamos perdendo, mas somos corinthianos e estamos aqui’”.

Um comentário:

Anônimo disse...

eu gosto exatamente como você receberá o seu nível de toda