quinta-feira, 9 de fevereiro de 2006

Muitos e muitos anos depois

1.11.1970: Wadih Helu manda seus capangas
surrarem os Gaviões

(tinha escrito um enorme texto, mas como ainda sou prega no blogger, perdi tudo)

Os Gaviões da Fiel já tinham quase um ano de existência quando Wadih Helu percebeu o perigo: não era bom nem para ele, nem para sua estrutura falida de administrar o futebol, que existisse um grupo politizado e contestador. Assim, depois de uma partida entre Corinthians e Santos, Wadih Helu mandou surrar os Gaviões: meninos e meninas de 16 a 22 anos.

Esse com a mão no peito é o Batata. Conheci no ano passado, quando garimpava fundadores vivos e as famílias dos que tinham morrido. Passamos horas e horas conversando, com coca-cola e bolacha de água e sal, e ouvi as mais deliciosas histórias de quem viveu intensamente sua juventude nas arquibancadas pelo País.

Era o torcedor folclórico. Fazia piada com os adversários, brincava com a polícia, se irritava com juiz e bandeirinha, invadia o campo, tirava um sarro da imprensa esportiva, dava entrevista em rádios e televisões, e saía nas capas de jornais e revistas quase semanalmente. Mais famoso do que a Elisa, torcedora-símbolo. Até soda cáustica tomou depois de uma derrota do time para o São Paulo.

Durante anos foi o torcedor fanático, até conhecer uma palmeirense e se tornar o fanático apaixonado. E descobrir que ela era noiva de outro também para se tornar o fanático suicida, e, sem sucesso, o fanático religioso. Longe das arquibancadas, Batata se tornou missionário. Abdicou do sexo e fez voto de castidade. Voto de pobreza também, embora sempre tenha vivido humildemente, com as dificuldades que a vida oferece quando ela lhe tira a mãe e o pai ainda pequenino.

Hoje, Batata é Vanderlei, luta para vencer o câncer de próstata e embora esteja longe de ser aquele menino irresponsável da soda cáustica e de tantas outras histórias, nunca deixou de ser Corinthians. Em suas andanças, pregando os ensinamentos de Jesus Cristo, ele costuma lembrar que o único Paulo que gosta é o da bíblia.

Fazia tempo que eu não falava com o Batata. A última vez tinha sido no ano-novo quando ele ligou para me dizer que eu tinha sido o presente que a vida deu a ele em 2005. Chorei. E chorei de novo hoje, quando liguei para ele e soube que, depois de 15 anos longe dos estádios, ele havia ido no sábado, contra o Bragantino. Feliz da vida, me disse com essas palavras:

“Nossas conversas sobre Corinthians e Gaviões da Fiel me despertaram tanta saudade que vou precisar ir a todos os jogos para conseguir matá-la.”

Batata opera dia 17 de fevereiro, mais uma vez. Força para ele. Muita.

NOTA: A foto foi encontrada toda amassada, dentro de um saquinho plástico, de supermercado, na casa do Batata. Ele recebeu uma bronca porque, mesmo estando viva em sua memória, essa história merece ser contada para todos aqueles que procuram os Gaviões. E aos que não procuram também.

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